O próximo convidado do ciclo "Quintas de Leitura" é o poeta Vítor Nogueira.
Ele é unanimemente reconhecido como uma das vozes mais importantes da chamada "novíssima poesia portuguesa".
Publicou cinco livros de poemas. A saber:
A VOLTA AO MUNDO EM 50 POEMAS (Editorial Minerva, 1999)
SENHOR GOUVEIA (Averno, 2006)
BAGAGEM DE MÃO (&etc, 2007)
NOVAS MEMÓRIAS DE ANSIÃES (com A. M. Pires Cabaral, Manuel de Freitas e Rui Pires Cabral. Averno, 2007)
COMÉRCIO TRADICIONAL (Averno, 2008)
O guião poético da sessão do próximo dia 23 de Abril incluirá poemas de três destes livros.
As leituras ficarão a cargo dos actores Maria do Céu Ribeiro, Paulo Campos dos Reis, Pedro Lamares e ainda de Susana Menezes.
Iniciamos hoje a divulgação de alguns dos poemas que serão lidos na referida sessão.
A RAZÃO PELA QUAL O SOL AQUECE
O Sol aquece devagar. Sempre assim foi
na Rua Alexandre Herculano, a rua onde
o Senhor Gouveia um dia desejou ser poeta,
ao tirar pela primeira vez o chapéu a uma senhora,
talvez em meados da década de cinquenta.
De resto, o Senhor Gouveia nunca procurou
a razão pela qual o Sol aquece devagar a Rua
Alexandre Herculano. Nunca soube porquê,
mas acha bem.
*
ÀS VEZES OS PÁSSAROS
Às vezes os pássaros encaixam voos exóticos
no céu recortado pelos prédios. Deixam-se cair,
sem que alguém os possa acusar de suicídio.
A Rua Alexandre Herculano tem destas coisas,
verdadeiramente indecifráveis. Coisas fundas
a que me venho habituando desde que aluguei quarto
na casa do Senhor Gouveia, que um dia desejou
ser poeta e entretanto simplesmente
aluga quartos.
*
JÁ DEPOIS DA MEIA-NOITE, TRÊS RAPAZES
Já depois da meia-noite, três rapazes
acendem cigarros com palavras,
esquecidos dos vizinhos e do sono
que os retém no interior dos edifícios.
É um sono fácil o que, justos,
os vizinhos cultivam desde sempre.
Em toda a rua, só o Senhor Gouveia
sabe o que é contar carneiros. Lá fora
três rapazes continuam, cigarros acesos
com palavras. A rua dorme, não se importa.
O Senhor Gouveia chega a ponderar
um telefonema para a polícia. Ao invés, escreve
um soneto. Enfim, saiu-lhe
mal (nada que nunca tenha acontecido).
(Vítor Nogueira, in "Senhor Gouveia"/Averno)
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