26/11/13

Poema de Golgona Anghel


NO DOMINGO PASSADO,
estando eu feita num fanico,
resolvi passar em casa da Gabi.
Ela ouviu, ouviu,
foi estender a roupa,
voltou,
foi comprar pão,
voltou,
e eu ali num canto da cozinha
a gastar as gengivas
na rua da amargura,
até que, enfim, me tirou o osso e tapou a boca.
«Eu já te tinha avisado!»
Estava preparada
para suportar as agressões todas,
ralar com as unhas as pedras da calçada,
quando a Gabi se virou para mim e disse:
«Sabes, agora tenho um cliente novo.»
Por delicadeza, senti, de imediato,
a necessidade de lhe perguntar.
«Quem é?» Baixou então a voz e
deu mais um jeitinho na roupa com o canto do olho.
«Um pugilista.»
«Sabes, a musa precisa de alguma porrada.»


in "Como uma flor de plástico na montra de um talho" /Assírio&Alvim

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