18/01/10

a morte em três dimensões

o diabo ganiu de fúria quando me viu,
baixou a cabeça cem metros e encarou-me
pequeno e insignificante. por momentos,
não fez nada. reparei nos mutilados que me
traziam instrumentos de corte quando alguém me
ateou o fogo. depois, ele disse,
tens muito com que te entreteres, mas podes
começar por oferecer os pulmões à fome dos outros, no
inferno, como sabes, não se respira. e eu usei a adaga
para furar a pele e abrir caminho entre as
costelas, com a própria mão retirei
os pulmões e estendi-os no chão, pequenos,
fatiados


a margarida faz esborre

estou com o joão peste a
ver quem passa. o parque está
calmo e não há sobressaltos.
o joão pergunta, ei, senhor monstro,
quem lhe contou isso. rimos.
o senhor monstro quer sentar-se,
mas tem entre as pernas
a margarida que lhe entrou pelo cu.
que faz ela aí, perguntei eu

está à procura de ideias, disse
ele. se eu me sentar,
o mais certo é partir-lhe a
espinha das costas, desfazer-lhe os ossos.
dá-me pena

reparamos, antes ainda, que
os rapazes estão impossíveis,
ficam-nos com o dinheiro em troca
de um biscate. para irem buscar o
jornal já não chega que lhes digamos um
poema do cesariny, ou mesmo que lhes
prometamos bilhetes para os concertos.
gozam-nos as barrigas a crescer,
o lustro da calvice

os rapazes trazem o jornal, chupam
gelados, agarram nas moedas à pressa,
empurram o senhor monstro, ele cai,
a margarida faz esborre

(poemas de valter hugo mãe / pornografia erudita / Cosmorama edições)

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